Em reportagem de O Dia, cientista social do CESeC, Julita Lemgruber, ressalta que apreensão de armas deve ser motivo de reflexão, não de comemoração pelas forças de segurança
Rio – Das unidades listadas pela PM como sendo as que mais apreendem fuzis, nenhuma está em uma região pacificada. Segundo o coronel Lima Freire, esse ainda é um resultado da instalação das UPPs.
“Não vou ser hipócrita e dizer que não há fuzil em (área de) UPP. Mas nas 38 unidades, só foi apreendido um total de seis fuzis neste ano. Ou seja, a diferença da UPP é a presença do policial no local, que afasta o marginal com armamento pesado”, aposta.
De acordo com o oficial, a presença de agentes evita a circulação de marginais com esse tipo de arma. O levantamento aponta que seis fuzis foram apreendidos pelo Comando de Polícia Pacificadora. “O bairro da Tijuca, cercado por UPPs, por exemplo, não aparece no ranking”, explica Freire.
Indagado se o maior número de apreensões ocorre devido a uma maior entrada de fuzis no estado, o oficial desconversa: “Cabe à Polícia Federal analisar, mas o reabastecimento tem sido constante”.
A cientista social Julita Lemgruber afirmou que o maior número de apreensões não deve ser motivo de comemoração pela PM. “Isso deve ser estudado. Nós sabemos que muitas dessas armas são desviadas da própria corporação”, opinou.
No ano, 304 fuzis são apreendidos
Armas de alto poder de destruição nas mãos de bandidos ameaçam a segurança de quem vive no Rio. Somente este ano, 304 fuzis foram retirados de circulação pela Polícia Militar, superando a maior marca já registrada, que havia sido no ano passado, quando 282 dessas armas foram apreendidas. O AR-15 é o modelo de fuzil mais encontrado este ano pela corporação.
Para o chefe do Estado Maior da PM, coronel Lima Freire, a quantidade recorde de apreensões se deve ao combate ao roubo de cargas — delito que cresceu 32,8% entre janeiro e setembro deste ano, em comparação com o mesmo período anterior. “As quadrilhas que roubam cargas as levam para dentro de complexos, como a Pedreira e Chapadão, onde há traficantes que têm como nicho não só o tráfico, mas a venda de cargas roubadas. Para os roubos, eles usam fuzis, que são armas de maior potência e empoderamento”, afirma.
É justamente na região dos complexos do Chapadão e da Pedreira que estão o 41º BPM (Irajá) e o 9º BPM (Rocha Miranda), unidades recordistas de apreensões de fuzis, com 51 e 23 fuzis recuperados, respectivamente, desde 1º de janeiro até ontem. As unidades especiais como o Batalhão de Operações com Cães e o Batalhão de Operações Policiais Especiais também encontraram grande número de fuzis, mas a PM não detalhou em quais regiões. Juntas, essas unidades haviam apreendido 97 fuzis até 26 de novembro, segundo levantamento obtido pelo DIA.
Entre os modelos que mais são encontrados estão AR-15/M16 (104); AK-47 (84); FAL 7,62 (48); AR-10 (14) e Ruger (10). Ao todo, 21 fuzis apresentaram peças de diferente fabricantes, apontando a presença de armeiros profissionais.
É o caso do fuzil apreendido na prisão do traficante Edvanderson Gonçalves Leite, o Deco, no Complexo da Maré, ocorrida há cinco dias. A arma estava sendo montada e foi encontrada dentro de um veículo abandonado graças ao faro de um cachorro da corporação. O fuzil tinha até uma mira de precisão, ou seja, estava sendo construído para ser usado por um snipper (atirador de elite).
E vale tudo para tentar tirar os fuzis das mãos de bandidos. No dia 18, o tenente Carlos Duarte, de 31 anos, trocava tiros com traficantes da Cidade de Deus que tentavam invadir a Gardênia Azul. Já amanhecia quando dois deles foram presos, sem as armas. O oficial, então, começou a mergulhar fardado no pântano, atrás do armamento. Após 30 minutos, emergiu segurando um AR-15. “Tive medo só dos jacarés”, diz.
Lima Freire elogiou a atitude do oficial, que mergulhou em uma área de charco, atrás da Vila do Pan. “A ação dele mostra nossa dedicação, nosso ímpeto em tirar essas armas de circulação”, disse. A PM apreende uma média de 600 armas por mês.