Resumo: No Brasil, desde que o tema da violência urbana deixou de ser monopólio do pensamento policial e militar, a sociedade civil começou a tomar conhecimento de que nossos índices de violência letal superam o de países em guerra e de que as armas de fogo estão dizimando parte da população masculina. Essa violência tem sexo, cor e idade: quem mais morre e quem mais mata são os rapazes negros, na faixa etária de 15 a 29 anos. Entretanto, a discrepância entre o número de mortes de homens e mulheres não deve ocultar que violência armada acontece como uma cascata, na qual causas e efeitos acabam se embaralhando e se reforçando mutuamente. Um exemplo é a violência doméstica, fonte e matriz de comportamentos que ao longo da vida convertem-se em uma forma de linguagem. A família violenta é o espaço onde meninos e meninas aprendem as primeiras lições, seja como testemunhas ou como vítimas directas de agressões. Pesquisa realizada em 2005 aponta para ligações entre duas esferas em geral pensadas como independentes, mostrando que, para muitas mulheres, as armas e o medo transitam sem fronteiras entre o público e o privado, entrelaçando a violência do crime àquela da intimidade.