UPPs completam dois anos com aprovação alta e planos de expansão

Para pesquisadores, sucesso de projeto depende de ações sociais nas favelas do Rio.

Na Cidade de Deus, número de homicídios caiu de 34 para seis no ano seguinte à instalação da UPP

 

Com um alto índice de aprovação e planos de expansão, a adoção das Unidades de Polícia Pacificadora (UPPs) como estratégia de recuperação do controle de favelas dominadas pelo tráfico armado no Rio completou dois anos no domingo, 19 de dezembro.

A data marca o aniversário da ocupação da comunidade Santa Marta, em Botafogo. De lá para cá, 13 UPPs foram instaladas no município, afetando a vida de cerca de 230 mil moradores. A previsão do governo é chegar a entre 40 e 50 unidades até 2014, totalizando 165 favelas ocupadas.

Na opinião de analistas entrevistados pela BBC Brasil, o principal mérito do projeto das UPPs é retirar dos traficantes o controle sobre as comunidades, mas a iniciativa depende de ações sociais na esteira da ocupação militar para se tornar uma política efetiva no longo prazo.

‘Não basta ocupar militarmente. É preciso que o Estado entre com todos os serviços e benefícios que cabem a um cidadão comum incorporado à sociedade formal. Esse é o pulo do gato’, diz o cientista político João Trajano Sento Sé, professor do departamento de Ciências Sociais da Universidade Estadual do Rio de Janeiro (Uerj).

‘É preciso dar ênfase a todas as ações que não são policiais, e sim sociais’, reforça a antropóloga Alba Zaluar, coordenadora do Núcleo de Pesquisa das Violências da Uerj. ‘Essas ações são importantíssimas para que haja um retrocesso na conquista de jovens vulneráveis pelo tráfico.’

 

Popularidade

Se antes a imagem da polícia era marcada por incursões truculentas e trocas de tiro com o tráfico, hoje a confiança nos policiais já é maior nas favelas com UPPs do que nas comunidades sem a presença policial.

Um estudo realizado pelo Instituto Brasileiro de Pesquisa Social (IBPS), a pedido do jornal O Globo, aponta que 60% dos moradores de favelas pacificadas confiam na políca, contra 28% nas comunidades sem UPPs.

De acordo com a pesquisa, 92% dos 400 moradores consultados disseram aprovar as UPPs. Nas favelas sem a presença policial, onde outras 400 pessoas foram entrevistadas, a aprovação é de 77%, e 79% se dizem favoráveis à eventual chegada de uma UPP.

Para Robson Rodrigues, responsável pelo Comando da Polícia Pacificadora, as UPPs têm sido bem-sucedidas ao recuperar os territórios, afastar a criminalidade violenta, aumentar a legitimidade da polícia e estabelecer uma relação de confiança com a comunidade.

Rodrigues admite, porém, que o programa ainda está no começo, e há importantes desafios pela frente. ‘Não podemos nos deixar contaminar por uma certa euforia, algo que no passado já levou ao fracasso de outros programas inicialmente bem sucedidos . Estamos nos valendo de pesquisas criteriosas e fazendo uma autoavaliação constante para melhorar cada vez mais’, diz.

 

Abrangência

Uma das principais críticas às UPPs, que viraram o carro-chefe do governo de Sérgio Cabral, é que elas não podem ser aplicadas em todo o Rio e Grande Rio, já que o território abrange cerca de mil favelas.

Para João Trajano Sento Sé, seria mesmo inviável levar o programa para tantas comunidade. Por isso, diz o cientista político, elas não devem ser pensadas como algo de que esses territórios dependerão para sempre.

‘As UPPs serão bem sucedidas se imaginarmos que em algum momento elas serão desnecessárias’, avalia o professor da Uerj.

Para Sento Sé, a presença policial mais ostensiva poderá se tornar menos necessária gradualmente, quando a presença do Estado se instituir com projetos de urbanização, saneamento, acesso à Justiça, educação e assistência social.

 

Custo

Outro obstáculo para a expansão das UPPs é o alto custo da operação, devido ao grande número de policiais envolvidos.

De acordo com a Secretaria de Segurança Pública, uma UPP de cem policiais, como a do Santa Marta, custa ao Estado mais de R$ 250 mil por mês e, em média, R$ 2,4 milhões para a instalação.

A construção das sedes vem sendo financiada pela iniciativa privada, com o envolvimento de empresas que apoiam o projeto. O bilionário Eike Batista recentemente prometeu à secretaria bancar o custeio de todas as futuras sedes de UPPs.

Apesar dos investimentos necessários, as autoridades avaliam que a relação custo-benefício tem se mostrado favorável. ‘Os indicadores de criminalidade violenta despencaram’, diz Robson Rodrigues.

No Santa Marta, por exemplo, os registros de roubos no primeiro ano após a ocupação diminuíram 39,5% em relação ao ano anterior.

Já na Cidade de Deus, quando se compara o primeiro ano pós-UPP com o ano anterior, percebe-se que o número de roubos diminuiu 68,6%. O de homicídios caiu de 34, no ano anterior à UPP, para seis no ano seguinte.

 

UPP Social

A experiência das primeiras UPPs mostrou que, no cenário de graves carências das favelas, os policiais presentes logo passaram a ser requisitados pelos moradores para resolver problemas muito além de suas atribuições – da falta de água à demanda por creches.

‘Vimos uma polícia sendo demandada extraordinariamente para lidar com situações que não são de sua competência’, diz Pedro Strozenberg, subsecretário de Promoção e Defesa de Direitos Humanos do Estado.

Para tentar lidar com o problema, a Secretaria Estadual de Assistância Social e Direitos Humanos (SEASDH) criou, em agosto, a UPP Social. O objetivo é coordenar iniciativas promovidas por governo, município, ONGs e empresas nas favelas atendidas.

‘A gente não tem muita ilusão. As coisas estão mudando mesmo, mas ainda falta muito. A distância entre a favela e o resto da cidade é muito grande’, admite a subsecretária de Ações Integradas no Território, Silvia Ramos, coordenadora do programa.

Por enquanto, a UPP Social chegou a apenas quatro das favelas com UPPs.

Alba Zaluar critica o fato de haver sempre um hiato entre a ação policial e a chegada da UPP Social. ‘Esse hiato tem que diminuir, e idealmente até desaparecer’, diz a antropóloga.

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