Prisão de bandidos vale viagem à Ilha Grande

PMs que capturarem traficantes em guerra na Rocinha terão direito a fim de semana em pousada e a 15 dias de folga.

RIO – Um fim de semana inteiro gratuito, e com direito a acompanhante, num paraíso ecológico na Costa Verde do estado: a Ilha Grande. Somente isso, talvez, já valesse a pena para que integrantes do Batalhão de Choque (BPChoque) da Polícia Militar fizessem o seu trabalho constitucional. Mas a criatividade do comando da unidade foi além: está oferecendo, também, 15 dias de folgas, a título de dispensa meritória, a quem prender dois traficantes da Favela da Rocinha.

A iniciativa foi divulgada ontem pela PM na forma de um cartaz com as fotos dos dois procurados: Amaro Pereira da Silva, o Neto, de 31 anos, e Inácio de Castro Silva, o Canelão, de 32. Eles travam uma guerra pelo controle da venda de drogas na Rocinha, que já resultou em mortes, entre elas a do líder comunitário Vanderlan Barros de Oliveira, o Feijão, atribuída a Canelão.

O tenente Alexandre de Lima Ramos, chefe de comunicação social do BPChoque, disse que esses bandidos representam uma ameaça à comunidade e que a divulgação das fotos tem o objetivo de estimular a memória dos policiais. A dispensa meritória, acrescenta, está prevista no regulamento interno da corporação. Já a viagem para a Ilha Grande será custeada pelo comandante do batalhão, o coronel Fábio Souza. A pousada que hospedará os PMs já foi escolhida. Segundo o tenente, o objetivo é a prisão dos bandidos.

— Não há o objetivo de estimular autos de resistência (mortes em confronto com a polícia). Frisamos que o objetivo é a prisão dos traficantes, que têm levado insegurança à Favela da Rocinha — explica Ramos. — É uma forma de estimular os policiais a procurarem elementos específicos. Então, o comando entendeu por bem usar o artifício do benefício.

A antropóloga da Uerj Alba Zaluar, especialista em segurança pública, considera a medida positiva:

— Estimular a prisão e não a morte me parece uma forma correta de agir com os policiais. Veja o caso do Matemático (o traficante Márcio José Sabino Pereira, morto por PMs de dentro de um helicóptero, em Senador Camará, no fim de semana). Estão valorizando aquilo que a polícia não tem mais feito: prender em vez de matar — analisou Alba.

O título do cartaz, uma criação do comandante da unidade, tem a seguinte frase: “Grande promoção do Batalhão de Choque. Na prisão de Canelão ou Neto 15 dias de folga + 1 fds em Ilha Grande”.

Julita Lemgruber, coordenadora do Centro de Estudos de Segurança e Cidadania (CESeC), da Universidade Cândido Mendes, aponta uma contravérsia na medida.

— Há prêmios de todo o tipo. Houve um tempo no Rio que se premiava quem matasse mais. Agora, se dá com a prisão de A ou B. Oferecer recompensa pela realização de um trabalho que é obrigação da polícia é sempre complicado. Uma coisa é a gratificação institucionalizada, como a que a Secretaria de Segurança oferece pelo cumprimento de metas. Outra coisa é uma medida pontual. Uma unidade da PM criar um benefício deste tipo pode estimular uma “caçada” a pessoas acusadas de alguma ilegalidade. Isso pode ser desvirtuado — comentou Julita.

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