Das planícies ao Planalto: como Goiás influenciou a expansão do reconhecimento facial na segurança pública brasileira

Mesmo sem protagonismo nas agendas de pesquisa sobre violência, Goiás tem sido palco de importantes disputas na área da segurança pública. No estado, a chamada “modernização da segurança pública” tornou-se moeda de ganho para políticos da extrema direita goiana ligados às bancadas da Bala, da Bíblia e do Boi.

Desde 2014, verbas do governo estadual e emendas parlamentares financiam a instalação de câmeras de videomonitoramento em Goiânia e na região metropolitana. Em 2019, o Ministério da Justiça e Segurança Pública lançou a portaria nº 793, que disponibiliza recursos para a instalação de tecnologias de reconhecimento facial (TRF) em estados e municípios. Naquele ano, municípios goianos enviaram 51 dos 89 projetos recebidos pelo Ministério. Os 37 aprovados estão em funcionamento e tiveram investimentos de cerca de 50 milhões de reais em dois anos.

A proliferação para cidades do interior ocorreu sem coordenação do governo estadual. Na expansão municipalizada, as prefeituras receberam recursos e contrataram empresas para implementar e gerir o serviço. Dos 37 municípios que realizaram pregões, em 12 não há contratos disponíveis no Portal da Transparência; das 25 cidades que disponibilizam informações, 23 tiveram licitações ganhas por duas empresas ligadas a famílias de políticos tradicionais do estado.

Tais tecnologias se alastraram em detrimento da aplicação de recursos em áreas fundamentais como saneamento básico e saúde, e estenderam-se a cidades com índices baixos e estáveis de crimes. Além disso, a implementação do reconhecimento facial caminhou com aumento da repressão, sobretudo de grupos vulneráveis. Internacionalmente conhecidas pelos vieses de raça e gênero, as TRFs cresceram de forma muito mais acelerada que a ampliação do alcance da Defensoria Pública de Goiás, presente em apenas 5 municípios do estado, incluindo a capital.

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