Moradores reclamam do aumento da criminalidade em Niterói

Cabine da PM na Praia de Icaraí, Zona Sul de Niterói/ Luisa Valle

RIO – Moradores de Niterói, cidade com o melhor Índice de Desenvolvimento Humano (IDH) do Estado do Rio, e a terceira do país, têm sofrido com o aumento da criminalidade. Só na última semana, o dono de uma rede de colégios foi executado numa das ruas mais movimentadas do Centro ; um prédio da Zona Sul foi assaltado por dez homens armados; e um shopping de São Francisco, área nobre da cidade, foi invadido por bandidos durante a madrugada . De acordo com estatísticas divulgadas pelo Centro de Estudos de Segurança e Cidadania (CeSec), da Universidade Candido Mendes, entre 2000 e 2007, ocorrências de roubo a residência e roubo de veículos duplicaram. No caso de roubo a transeunte, o aumento foi de 190%, ou seja, quase triplicou em sete anos, pulando de 885 casos em 2000 para 2.572 em 2007.

– Eu tive o meu carro furtado na Travessa Dr. Roberto Tortelli, esquina com Avenida Sete de Setembro, e minha sogra também. [Isso] sem contar com os outros moradores que eu conheço e moram na mesma região. O roubo de automóveis, ônibus e, agora, à residência estão se tornando uma rotina em Niterói – afirmou, em depoimento ao site do GLOBO, o leitor Renato das Neves Cordeiro.

A Organização das Nações Unidas recomenda que o efetivo policial de cada município seja de 1 policial para 250 pessoas. Em Niterói, no entanto, esse número é quase três vezes mais alto, com 1 policial para cerca de 700 pessoas. Isso acontece porque o 12º batalhão da Polícia Militar, responsável pelo policiamento da área, precisa dividir seus 820 homens entre as cidades de Niterói, que tem 474 mil habitantes, e Maricá, que possui cerca de 105 mil moradores. As delegacias da cidade também estão com problemas de efetivo. Recentemente, o colunista do GLOBO Niterói, Gilson Monteiro, denunciou em seu blog que a 81ª DP, de Itaipu, Região Oceânica de Niterói, suspendeu as investigações pois os quatro policiais do setor precisaram ser deslocados para o balcão de ocorrência.

O comandante do 12ºBPM, tenente-coronel Ricardo Pacheco, admite que o número de policiais poderia ser maior, mas argumenta que o problema de Niterói é muito maior do que simplesmente de segurança.

– Acho que o índice de criminalidade nunca é aceitável, claro, mas também não podemos culpar apenas a polícia militar. Niterói hoje é um pólo que tem atraído muita gente, e tem crescido muito. A circulação diária dentro do município fica entre 500 mil e 1 milhão de pessoas. Além disso, a especulação imobiliária é enorme. Ou seja, o número de pessoas que vêm para a cidade se aproveitando desse crescimento é grande. Por isso, eu poderia ter o dobro de policiais ou o triplo, mas dificilmente eu não conseguiria evitar – afirmou o comandante, que disse manter, por dia, cerca de 60 viaturas circulando na área do batalhão.

– Hoje você precisa otimizar o policiamento. Como eu tenho uma área gigantesca para cuidar, o que nós fazemos é analisar as áreas onde nós conseguimos evitar mais assaltos, onde tem as maiores concentrações de pessoas e de ocorrências. Além disso, a maior reclamação da população da cidade é a falta de policiais em pontos visíveis. Por isso, nós trabalhamos também com os corredores de visibilidade, que são as viaturas localizadas em pontos estratégicos, onde há maior volume de pessoas passando, em horários de rush da cidade. Isso é a questão da sensação de segurança.

Viatura da PM parada próximo ao Campus da UFF/ Luisa Valle

– Roubaram minha moto quando eu saía de casa, dois homens armados que apareceram nem sei de onde. Hoje moro na região oceânica de Niterói, mas não vejo mais tranqüilidade. Colocaram um monte de viaturas novas nas ruas, mas elas não podem sair do local por não ter policiais disponíveis. Hoje gasto cerca de mil reais com segurança particular, mais o que gasto pagando impostos, e não tenho nem metade do que deveria ter pelo poder público, garantido pela Constituição. Será que alguém sabe para onde vai nosso rico dinheirinho? Onde está o poder público? Será que ele existe mesmo? Será que de fato vivemos em um Estado Democrático de Direito? Acho que não! a verdade é que estamos a mercê da sorte, e não só com relação a segurança pública. É relmente triste e revoltante o que vemos hoje, um povo abandondo e sem governo – afirmou, em depoimento na seção Opine, do Site do GLOBO, o leitor Felipe Harfield Brasil.

O secretário municipal de Segurança Pública e Direitos Humanos de Niterói, coronel Hélio Luiz Azevedo, concordou que não é possível culpar apenas a polícia militar pelo aumento da segurança na cidade, mas ressaltou que o número de policiais nas ruas está muito abaixo do ideal.

– Hoje, se você tem 550 policiais na rua é muito. Isso porque é preciso contar com aqueles que estão de folga, os que estão de férias, licença, e até os que estão emprestados. O problema disso começou no ex-governo, que não repôs o efetivo, nem investiu em policiamento. Isso coincid, inclusive, com o início o crescimento. Só agora, com o novo governo, que estão tentando repor esse efetivo, mas ainda não conseguiram. O ideal era que o 12ºBPM tivesse, no mínimo, 1.400 homens – afirmou.

Sobre o aumento da população, resultado da forte especulação imobiliária que existe na região, o secretário afirmou que realmente houve um aumento da população de rua da cidade, o que, provavelmente, acarretou o aumento de pequenos delitos como o roubo a transeunte. De acordo com Azevedo, para tentar diminuir os índices, a prefeitura tem realizado, em parceria com a Polícia Militar, pelo menos três operações diárias para recolher essas pessoas que, segundo ele, vem de outros municípios.

– Principalmente da Zona Norte do Rio, de bairros como Irajá e Méier, além de São Gonçalo e Itaboraí. São famílias inteiras que vem para cá. Por isso, aumentamos esse trabalho. Além disso, temos uma guarda municipal que atua também no ordenamento urbano da cidade, um dos problemas de Niterói. Nós, inclusive, conseguimos acabar com os ambulantes, o que fez com que o número de pequenos delitos diminuíssem em algumas áreas. Esse trabalho comunitário, aliás, é reconhecido como um dos melhores do país – ressaltou.

Quadrilhas organizadas

Segundo a socióloga Silvia Ramos, pesquisadora do CeSec, a relação entre o crescimento de Niterói e o aumento da criminalidade é um fenômeno semelhante ao que houve na bacia de Campos, principalmente em Macaé, com a exploração do petróleo pela Petrobras.

– Eles tiveram um aumento nas taxas da criminalidade justamente nessa área, onde houve um crescimento devido aos investimentos que entraram no município com a exploração do petróleo. Essas regiões são campeãs no aumento das taxas de criminalidade – ressaltou a pesquisadora.

Silvia Ramos, no entanto, chamou atenção para outro tipo de crime que parece estar crescendo na cidade: o crime organizado.

– Esse assalto a um shopping é algo muito ousado. Bandidos que fazem algo assim, sabendo que estão dentro de um shopping, onde há seguranças e câmeras de circuito interno, estão praticamente dizendo que não serão pegos. Acho que isso é muito grave, e também é uma ousadia. Isso, na verdade, mostra que existe uma criminalidade organizada, que demanda investigação. Não dá para dizer isso tem relação com as pessoas menos favorecidas de outros municípios entrando na cidade – afirmou.

Em comentário no site do GLOBO, o leitor Carlos Eduardo Carvalho, afirmou que o prédio onde ele mora, em Icaraí, sofreu um assalto parecido com o que ocorreu na última sexta-feira, quando dez homens invadiram um edifício e fizeram pelo menos 20 reféns.

– O meu prédio também sofreu um assalto semana passada quase nos mesmos moldes! Seria redundante da minha parte ficar falando sobre as mazelas de Niterói – revelou.

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