Rio: Próximo governador deve priorizar combate à violência, defende especialista

Candidatos ao governo falam sobre suas propostas na área da segurança

RIO — Quase seis anos depois da instalação da primeira Unidade de Polícia Pacificadora (UPP), os quatro candidatos ao governo do Rio mais bem colocados nas pesquisas de intenção de votos veem a manutenção e a ampliação das unidades como um dos principais desafios na área de Segurança. Principal política de segurança do ex-governador Sérgio Cabral (PMDB) e do então vice Luiz Fernando Pezão (PMDB), que assumiu o governo em abril e concorre à reeleição, as UPPs ocupam hoje comunidades na Baixada Fluminense, nas zonas Sul, Norte e Oeste e no Centro da capital.

Convidados pelo GLOBO, Anthony Garotinho (PR), Lindbergh Farias (PT), Marcelo Crivella (PRB) e Pezão responderam por e-mail quais os desafios que o próximo governador vai encontrar (Leia a íntegra das respostas). Além deles, especialistas na área apontam as mudanças desejadas.

Em comum, os quatro candidatos fazem planos para as UPPs. Pezão diz que o “principal objetivo é consolidar, aperfeiçoar e ampliar as UPPs”. Para isso, segundo ele, serão construídas “delegacias de Polícia Civil em todas as unidades já instaladas”. O peemedebista diz ainda que UPPs serão instaladas “em toda a Região Metropolitana”. O petista Lindbergh, por sua vez, afirma que “a sobrevivência do projeto de pacificação depende de importantes melhorias. É preciso articulá-lo a programas que valorizem os jovens, reduzam a evasão escolar e estimulem a criatividade cultural”. Diz ainda que “as UPPs devem se tornar verdadeiras Unidades de Políticas Públicas, agregando à ocupação militar um exército de professores e médicos e ampliando serviços essenciais”.

Para Crivella, “o programa das UPPs deve ser transformado em Política de Estado”, e a implementação da “Escola de Polícia Pacificadora” vai aperfeiçoar a qualificação dos policiais. O líder nas pesquisas, Garotinho, fala em “implantar o batalhão de defesa social, porque não existe ocupação sem ação social”.

— O próximo governador terá o desafio de resgatar o programa das UPPs, que passa por uma crise, além de priorizar o combate à violência em áreas da Baixada e da Zona Oeste da capital. Mas, além disso, vai ser preciso trabalhar para diminuir os homicídios, que têm aumentado nos últimos dois anos, e reformar a polícia, que deve deixar de ser uma polícia de guerra, de confronto — diz Ignacio Cano, pesquisador do Laboratório de Análise da Violência da Uerj.

Primeira mulher a dirigir o sistema penitenciário do Rio, Julita Lemgruber, do Centro de Estudos de Segurança e Cidadania da Universidade Candido Mendes, acredita, no entanto, que o maior desafio vai ser “criar uma política de Segurança Pública”:

— Tivemos uma política de criação de UPPs no governo Cabral, mas a ocupação das favelas não veio com o verdadeiro policiamento comunitário. Faltou articulação. O próximo governador pode tentar salvar as UPPs, porque os moradores querem segurança e não só que mude o dono do morro. Além disso, nas áreas não pacificadas, a polícia entra, troca tiros, sai e causa mortes. Isso é indesculpável, inaceitável depois de tantos anos. Isso não é política de segurança, é estratégia de policiamento, que pode ser definida como guerra às drogas.

ESTADO AVANÇOU NO MAPA DA VIOLÊNCIA

Ao longo de 14 anos, entre 1998 e 2012, de acordo com o Mapa da Violência, o estado do Rio, que amargava a 3ª pior taxa de homicídio, por cem mil habitantes — 55,3 —, passou para o 18º lugar, com taxa de 28,3.

Dados do Instituto de Segurança Pública (ISP) também apontam avanço: em fevereiro de 2012, o Rio registrou o menor número de roubos na rua desde 2007 e em janeiro do mesmo ano foi registrado o menor número de homicídios dolosos de toda a série histórica, feita a partir de 1991. Ainda assim, quando comparados os números do primeiro trimestre de 2013 e deste ano, dos 36 delitos computados pelo ISP, apenas três tiveram resultados inferiores aos do ano passado. Os homicídios registrados passaram de 1.197 para 1.459, 262 casos a mais. O total de roubos aumentou 45,6%, e o número de furtos também cresceu 5,5%. Vale destacar, no entanto, que em janeiro, fevereiro e março de 2014 o número de registros aumentou em 29.629 ocorrências (15,6%).

De olho no Guanabara, Pezão, Garotinho, Crivella e Lindbergh concordam que o efetivo das polícias deve aumentar. O peemedebista diz que vai ampliar “o efetivo da PM e da Polícia Civil nos bairros e territórios que não precisam de pacificação”, e explica ainda que, até 2018, se for eleito, “serão mais 12 mil PMs”. Garotinho, por sua vez, diz ser preciso “aumentar o efetivo de rua da PM”. E Crivella aponta ser necessário um “aumento real do policiamento ostensivo na Baixada e em São Gonçalo, com a contratação de seis mil policiais”. Diz ainda que vai colocar ” policiais pelos bairros e cidades onde realmente existe a necessidade de policiamento. Serão distribuídos onde o crime aumentou e as pessoas não veem os policiais nas ruas”. O petista vai além e afirma que o “Estado deve buscar políticas que adequem as polícias à sua missão de garantidoras de direitos. As táticas, estratégias e metodologias de ação policial devem ser orientadas em torno da combinação de ações preventivas e de repressão qualificada, com ações mais eficientes de combate e repressão ao crime”.

— Ter mais policiamento é interessante, mas essa não é a questão. Como também não adianta distribuir melhor o efetivo se não tiver gestão. A gente peca por falta de entrosamento, de integração entre a Civil e a PM — diz Julita.

Sociólogo e autor do Mapa da Violência, Julio Jacobo destaca que a criminalidade no Rio começou a cair progressivamente a partir de 2003. A partir de 2008. com a instalação da primeira UPP, no Morro Santa Marta, em Botafogo, Jacobo lembra que o crescimento da criminalidade passou a recuar mais na capital do que no interior do estado.

— O Mapa mostra que esse fenômeno não se deu só no Rio, outros estados passaram pelo mesmo processo. O que leva a pensar que a curva deveria ter sido mais íngreme por conta das UPPs. Mas, talvez isso se dê porque o governo enfrenta várias organizações criminosas, não é só o tráfico, tem as milícias, o contrabando… No entanto, acredito que para que a Segurança Pública mude é necessário uma política nacional que determine as competências de cada um e que solucione desde o sistema carcerário até as milícias, passando pelo tráfico. Isso é um processo longo, que precisa ser encarado de forma integral. Não pode ser estratégia de um partido político, mas política de Estado.

Coordenador do bacharelado em Segurança Pública da UFF, Lenin Pires diz que é “fundamental conceber uma visão mais integrada”.

— Segurança não pode ser pensada apenas envolvendo as instituições policiais. A organização dos aparelhos urbanos, com melhor iluminação e conservação das vias públicas, e até a organização do transporte contribuem e deixam a pessoa menos exposta. Fora isso, é um desafio integrar as polícias Militar e Civil. Se elas não se integram para atividades preventivas, de inteligência e de administração dos conflitos cotidianos, a tendência é que esse conflito se desdobre e se transforme num delito — diz Pires, lembrando ser preciso “padronizar o atendimento na Região Metropolitana e no interior”: — Claro que existem particularidades de um município para outro, mas não se pode mais achar que não tem violência em lugares ditos pacatos.

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