‘Vítimas de letalidade policial são mais jovens’, diz pesquisador; em 80 horas, cinco morreram no Rio

Cinco jovens mortos em 80 horas: Henrico Júnior, de 19 anos, tiro na cabeça; Tiago Freitas, 21 anos, baleado na cabeça; Lucas Costa, de 21 anos, executado em festa; Gabriel Alves, de 18 anos, baleado no peito; Dyogo Xavier, de 16 anos, tiro nas costas | Foto: Montagem com fotos de arquivo pessoal

Polícia Civil investiga circunstâncias das mortes de Dyogo Costa, de 16 anos, em Niterói, e de Henrico de Jesus, de 19, em Magé

RIO — Sentada nos ombros de um adulto, a pequena Sofia, de 7 anos, viu seu irmão mais velho, Dyogo Costa Xavier de Brito, ser enterrado nesta terça-feira aos 16 anos . O adolescente , que sonhava ser jogador de futebol , foi morto com um tiro nas costas durante operação policial na Favela daGrota , em Niterói . Ao pedir para fazer uma oração, a menina calou os gritos de protesto dos amigos e parentes do jovem que foram ao Cemitério São Francisco Xavier, em Charitas.

— Deus, que cada pessoa que esteja aqui sempre viva bem, que não perca ninguém assim desse jeito. Sempre quando alguém estiver assim bem triste, pega as suas mãozinhas e lava o coração dele. Deus, abençoe quem está aqui. E que todos sejam do bem e não sejam do mal, para que não façam coisa errada — disse Sofia, aos prantos.

Tiroteio em ação da PM na Mangueira tem um ferido e fecha a Visconde Niterói. Marca de tiro na parede de uma casa. Foto: Fabiano Rocha / Fabiano Rocha

Em 80 horas , outras quatro famílias choraram a perda de jovens para aviolência na Região Metropolitana do Rio. Da manhã da última sexta-feira até a tarde de segunda-feira, também foram mortos a tiros Gabriel Pereira Alves, de 18 anos, Lucas Monteiro dos Santos Costa, de 21, Tiago Freitas, de 21, e Henrico de Jesus Viegas de Menezes Júnior, 19 anos. Dyogo e Henrico foram mortos durante ações da Polícia Militar . Gabriel, que também tinha o sonho de se tornar jogador de futebol, foi atingido por uma bala perdida a caminho para a escola, na Tijuca. Já Lucas e Tiago foram executados por um grupo que invadiu uma festa em Água Santa .

Dyogo era jogador de futebol das divisões de base do América. Quando foi morto, com um tiro nas costas, ele ia para um treino e levava, na mochila, um par de chuteiras.

— O PM me falou que o meu neto era traficante. Não precisavam ter matado meu garoto. Era só abordar e ver que a mochila do Dyogo carregava a chuteira e o dinheiro da passagem — disse o motorista de ônibus Cristóvão Xavier, de 63 anos, avô de Dyogo. — Eu peguei ele no hospital quando ele nasceu, e agora peguei ele no colo quando ele morreu.

A Polícia Civil ainda vai ouvir a versão dos agentes dos batalhões de Choque e de Ação com Caes (BAC) que participaram da operação.

Trabalho e estudo

A 50 quilômetros de Niterói, outro jovem foi enterrado nesta terça. Henrico, de 16 anos , foi morto durante uma operação da PM na favelaTerra Nova , em Magé , na tarde de segunda-feira. Segundo parentes, ele havia ido à comunidade buscar uma motocicleta que estava no mecânico. O rapaz foi baleado na cabeça.

Ao registrarem o caso na Delegacia de Homicídios da Baixada, PMs afirmaram que o jovem estava armado. Sua família, entretanto, diz que ele era inocente. Desde o ano passado, Henrico trabalhava como estoquista num supermercado de Magé. Em seu perfil numa rede social, é possível ver várias fotos do jovem com o uniforme do estabelecimento, que confirmou a contratação. Ele também estudava e fazia um curso.

Em nota, a PM afirmou que apreendeu com Henrico um revólver, um radiotransmissor e drogas. O caso será investigado pela DH da Baixada.

Para o pesquisador Pablo Nunes, do Centro de Estudos de Segurança e Cidadania da Universidade Candido Mendes, a proporção de jovens entre as vítimas de assassinatos no Rio deve aumentar nos próximos anos, se for mantida a tendência atual de aumento de mortes em confrontos.

— Vítimas de letalidade policial são, em média, mais jovens do que as outras vítimas de letalidade violenta em geral. Como os homicídios estão caindo e as mortes pela polícia subindo, em alguns anos, vamos ter a redução da idade média dessas vítimas — disse Nunes.

Ao comentar as mortes dos jovens, o governador Wilson Witzel disse que as polícias estão trabalhando para evitar outros casos:

— Se os criminosos acham que matando inocentes vão fazer com que o estado pare, eles estão absolutamente enganados. Muito pelo contrário. O estado lamenta essas mortes. Vamos trabalhar para evitar novos casos. É um compromisso com a população, inclusive a mais pobre. Nós vamos começar algumas operações de ocupação para poder livrar nossas comunidades desse terrível mal.

Colaborou Matheus Maciel

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