Menos cocaína nas bocas-de-fumo do Rio

Número de apreensões de drogas feitas pelas polícias Federal e Civil cai; aumenta o consumo de ecstasy e crack

O tráfico está com dificuldades de trazer cocaína para o Rio e a droga está ficando escassa nos morros, segundo informações das polícias Federal e Civil. Desde 2003, a PF não faz apreensões de grandes carregamentos de cocaína ou maconha destinados às favelas do Rio. Policiais civis da Delegacia de Repressão a Entorpecentes (DRE) passam pela mesma situação: praticamente zeraram suas apreensões este ano no estado. Conversas entre traficantes interceptadas pela polícia revelam que a droga está faltando até mesmo para o consumo do próprio bandido. No Aeroporto Internacional Tom Jobim, no entanto, o grande número de apreensões de cocaína mostra que o Rio continua na rota do tráfico internacional. Uma das conseqüências do desabastecimento do tráfico nas favelas pode ser o aumento do número de crimes contra o patrimônio.

Dados da Coordenação Geral de Polícia de Repressão a Entorpecentes (CGPRE), unidade da Polícia Federal em Brasília especializada no combate ao tráfico de drogas no país, confirmam que as apreensões de cocaína e maconha na Região Sudeste caíram nos últimos cinco anos. Em 2000, foram apreendidas 25 toneladas de cocaína e 121 toneladas de maconha nos estados do Rio, de São Paulo e de Minas Gerais. As apreensões na região despencaram no ano passado para quatro toneladas de cocaína e 17 toneladas de maconha.

  

Traficantes estão se mudando para o Norte

O delegado federal Hebert Mesquita, da CGPRE, explicou que traficantes estão migrando para Amazonas, Acre e Rondônia, estados que ficam mais próximos dos países produtores de cocaína (Bolívia e Colômbia). Por isso, na opinião de Herbert e de outros policiais federais, os grandes carregamentos têm se tornado mais raros no eixo Rio-São Paulo. Diferentemente do que acontece no Norte do país, onde as apreensões mais recentes quase sempre são de mais de cem quilos.

– Menos droga tem chegado ao Rio e isso revela um sucesso da repressão policial no Sudeste. O que têm feito as organizações criminosas? Estão atuando no Norte, fazendo remessas vultosas de drogas para a Europa e os Estados Unidos pelos portos de Manaus, Belém e São Luís. Algumas cidades dessa região (como Manaus, por exemplo) experimentam grandes investimentos decorrentes da lavagem de dinheiro – disse Hebert.

Pesquisadores do Centro de Estudos de Segurança e Cidadania (Cesec), da Universidade Candido Mendes, identificaram nos últimos anos um aumento do número de crimes contra o patrimônio. O assalto a transeunte, por exemplo, passou de 17.884 casos em 2003 para 36.080 em 2005. O número de assalto no interior de coletivo subiu de 4.653 (2003) para 7.469 (2005) e os de seqüestro relâmpago pularam de 26 (2003) para 110 (2005).

O delegado Victor César Santos, chefe da Delegacia de Repressão a Entorpecentes (DRE) da Polícia Federal no Rio, disse que para evitar o transporte de drogas em grande quantidade os traficantes mudaram de estratégia: eles montaram depósitos em São Paulo e Minas Gerais, e usam “mulas” que trazem cocaína e maconha em pequenos carregamentos. No lugar de carretas com até três toneladas de droga em fundos falsos, a PF tem se deparado com desempregados transportando de ônibus cocaína e maconha na mala de viagem. O “tráfico formiguinha” aumentou.

– A droga está sendo estocada fora do Rio, quase sempre em cidades na divisa com os estados de São Paulo e Minas, e vem em pequenas quantidades para o Rio – disse Victor Santos.

Com o lucro reduzido nas bocas-de-fumo, os traficantes estão descendo os morros para assaltar.

– A cocaína virou raridade no mercado carioca e os traficantes estão ficando tensos com a queda no faturamento. No Rio, até o traficante está tendo dificuldade para cheirar – disse Marina Maggessi, chefe do Setor de Investigações da Delegacia de Repressão a Entorpecentes (DRE).

Segundo Marina, o mercado da droga no varejo no Rio tem sofrido uma grande transformação nos últimos anos. Com a falta de cocaína, os usuários estão migrando para outras drogas.

– No lado rico do Túnel Rebouças, o consumo de drogas sintéticas, como o ecstasy, aumentou muito. Do outro lado, nas áreas mais pobres, passou a reinar o crack – disse a inspetora da DRE.

  

Estado tem menos apreensões de drogas

Em janeiro deste ano, segundo dados do Instituto de Segurança Pública (ISP), ocorreram 531 casos de apreensão e porte de cocaína e maconha pelas polícias Civil e Militar no estado. Em março, o número caiu para 391. Essa queda também foi notada pelos pesquisadores Cesec.

– A partir de 2003, notamos que os registros de apreensões de drogas no estado caíram, assim como os registros de apreensões de armas. Enquanto isso, os crimes contra o patrimônio aumentaram – disse a economista e antropóloga Leonarda Musumeci, do Cesec.

Leonarda disse que pela estatística está claro que o número de apreensões aumentou 2000 para 2002, mas menos do que a média de anos anteriores. A partir de 2003, entretanto, os registros passam a despencar. Ela ressalta, no entanto, que é difícil relacionar a falta de cocaína nas bocas-de-fumo com o aumento da violência.

– É possível que a queda da oferta da drogas tenha provocado o aumento dos roubos no estado a partir de 2003, mas isso precisa ser analisado com mais profundidade. Os números podem também mostrar que o desempenho da polícia caiu – explicou Leonarda Musumeci.

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