No Senado, comissão sobre o tema não foi instalada. Na Câmara, as atividades estão paradas. Ocupando vazio deixado pelas autoridades, grupos da sociedade monitoram ações das forças federais no estado.
Quando aprovou o decreto de intervenção federal na segurança pública do Rio de Janeiro, o Congresso Nacional declarou que acompanharia os resultados, os gastos e fiscalizaria a ação inédita no país. Nove meses depois, as promessas não estão sendo cumpridas.
A comissão especial do Senado nunca foi instalada. Na Câmara, o grupo de deputados se reuniu apenas seis vezes, a última delas em abril, deixando de lado o que havia sido planejado para o debate e levantamento de informações sobre a situação no estado.
O monitoramento tem sido feito principalmente por entidades e grupos da sociedade, que divulgam relatórios e análises sobre o uso das Forças Armadas no combate ao crime no estado do Rio de Janeiro.
Em parceria com a Defensoria Pública do Rio de Janeiro, o projeto Circuito Favelas por Direitos tem percorrido comunidades pobres e reunido relatos de abusos praticados por forças de segurança.
O Observatório da Intervenção – iniciativa do Centro de Estudos de Segurança e Cidadania da Universidade Cândido Mendes e apoiado por entidades como a Anistia Internacional – é outro exemplo de iniciativa de monitoramento da ação na segurança pública do estado.
“Estamos monitorando o que acontece no estado, dados de crimes, tiroteios, etc. Os resultados não são positivos. E não vemos nenhuma melhoria estrutural na área de segurança”, diz a cientista social Silvia Ramos, coordenadora do Observatório da Intervenção.
A intervenção federal foi decretada pelo presidente Michel Temer em fevereiro deste ano e aprovada pelo Congresso Nacional. À época, a Câmara e o Senado também decidiram criar comissões especiais para avaliar a situação no Rio de Janeiro ao longo do ano.
Por ser a primeira vez que um presidente da República recorreu a uma intervenção federal, parlamentares, inclusive o presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM), que é do Rio de Janeiro, expressaram a necessidade de monitoramento da medida. A intervenção envolve o uso de recursos e gastos federais e, enquanto está em vigor, não se podem votar propostas que modifiquem a Constituição, como a Reforma da Previdência.
No Senado, os integrantes da comissão – apenas três titulares – sequer foram indicados. O grupo da Câmara realizou audiências públicas e viagens ao Rio de Janeiro no primeiro semestre.
Técnicos legislativos dizem que não há obrigação de a comissão apresentar um relatório final, que está previsto para o dia 1° de dezembro, mas o ideal é que isso seja feito, pois houve uso de dinheiro público.
A relatora da comissão da Câmara, deputada Laura Carneiro (DEM-RJ) informou que pretende concluir o trabalho no próximo mês. O coordenador do grupo, deputado Hugo Leal (PSD-RJ), está em viagem internacional a trabalho. A agenda da comissão ainda está vazia para as próximas semanas.
O Observatório da Intervenção, por sua vez, pretende divulgar, ao término da intervenção, previsto para 31 de dezembro, um balanço completo dos dados colhidos durante o período em que a medida vigorou no Rio de Janeiro.
Nesta semana, a rede de pesquisadores publicou um relatório sobre os primeiros nove meses de intervenção. Foram registrados 3.747 homicídios dolosos de fevereiro a outubro, o que representa uma queda de apenas 5% em relação ao mesmo período de 2017.
Silvia, que é contra a prorrogação do decreto, ressalta que esse resultado não deve ser exaltado, pois a comparação é feita com o ano passado, quando a criminalidade já estava bastante elevada.
O número de pessoas mortas pela polícia, por outro lado, aumentou 40% durante a intervenção – 1.151 casos foram contabilizados. E os tiroteios no Rio de Janeiro aumentaram 60%, segundo o levantamento do Observatório. De fevereiro a novembro do ano passado, houve o registro de 4.695 trocas de tiros. Nos meses da intervenção, foram 7.457.
“Não é que só houve coisas horríveis. Nosso ponto é: a intervenção, com lógica de guerra, tanques, batalhas, falhou e falha na área da inteligência. Queremos operações de inteligência. Elas são capazes de desarticular o crime sem colocar em risco a população das favelas”, defendeu Ramos.