Pouco importa se a preocupação com a perda de espaço da religião católica junto à população carcerária, cada vez mais aderindo às seitas evangélicas, contribuiu para a escolha do tema da Campanha da Fraternidade/1997. O que importa, de fato, é a inestimável contribuição que a CNBB pode dar, através desta campanha, para a melhoria do sistema penitenciário brasileiro.
No entanto, me parece que a CNBB deveria, ao lado de denunciar as deploráveis condições em que vive a quase totalidade dos presos no país, enfatizar a completa irracional idade que está por trás da utilização de penas de prisão para infratores que não praticam crimes violentos e/ou crimes graves.
Manter alguém preso neste país custa hoje, em média, R$ 364, 71 por mês e, em alguns estados, os números são ainda mais altos. Será que o contribuinte de Minas Gerais sabe, por exemplo, que está pagando r$ 529,84, ao mês, por cada homem ou mulher preso em seu estado? Alguém já perguntou ao contribuinte mineiro se ele está disposto a pagar tal quantia para manter na prisão infratores que não oferecem ameaça concreta à sociedade, que praticaram crimes sem nenhuma gravidade ou violência, e que, ao longo de suas penas, estão-se transformando em indivíduos muito mais perigosos?
Com a experiência de quase vinte anos de trabalho e pesquisa na área da Justiça Criminal, inclusive como diretora-geral do Sistema Penitenciário do Rio de janeiro, no período 91/94, e como responsável pela coordenação técnica do último censo penitenciário do Ministério da Justiça, posso afirmar que, pelo menos, 30% dos presos no país cometeram crimes como pequenos furtos, passaram cheques sem fundo de importâncias irrisórias (é sempre bom lembrar que o grande estelionatário nunca é preso, com algumas raríssimas exceções), fizeram uso de substância entorpecente ou praticaram delitos sem gravidade e violência.
Ora tais pessoas poderiam estar sendo punidas com penas alternativas à prisão. como a prestação de serviços à comunidade. desonerando o contribuinte duas vezes.
Primeiro. pela considerável economia de recursos que. ao invés de serem utilizados para manter tais pessoas na prisão. poderiam ser redirecionados para as .áreas de educação, saúde, moradia popular, saneamento básico e profissionalização da força de trabalho. entre outras. Em segundo lugar, porque ao exercerem as atividades determinadas judicialmente. os prestadores de serviços também podem significar uma economia aos cofres públicos. Podem trabalhar como operários em obras do governo. como auxiliares na área administrativa em secretarias de Estado, ou ainda como auxiliares em hospitais e pronto-socorro, só para mencionar algumas possibilidades. Podem. igualmente. atuar junto a ONGs voltadas para o atendimento da população pobre, onde os recursos humanos são sempre muito escassos.
A legislação brasileira prevê as penas alternativas desde 1984, mas, ao contrário do que ocorre em outros países, elas são ainda muito pouco utilizadas por aqui. Sobretudo porque faz parte do imaginário popular vincular pena à prisão: o povo pensa assim e os juízes também. Por outro lado, a legislação atual limita muito a possibilidade das penas alternativas.
O Conselho Nacional de Política Criminal e Penitenciária acaba de propor nova legislação nesta área, aumentando a abrangência das penas alternativas, o que está sendo examinado pelo Congresso nacional e a CNBB pode, definitivamente, contribuir para a rápida aprovação das mudanças, divulgando em sua campanha informações como as aqui apresentadas e esclarecendo à população sobre as inúmeras vantagens da prestação de serviços à comunidade. Condenar as prisões já não basta. Urge manter fora delas aqueles que podem ser punidos de outra maneira.