Alguém se lembra de Sidneya? Sabe quem ela era? Pois Sidneya Santos de Jesus era diretora da Penitenciária Bangu I e foi assassinada no dia 5 de setembro de 2000, ao chegar à sua casa, dirigindo seu próprio carro. Até hoje não se sabe quem a matou. O inquérito permanece aberto na 37a DP. Alguém se lembra da razão pela qual mataram Sidneya?
Sidneya morreu porque era uma mulher destemida e determinada. Sidneya morreu porque ousou lutar contra a corrupção no sistema penitenciário do Rio de Janeiro.
A morte não desvendada e esquecida de Sidneya, e seus assassinos à solta, só contribuem para que a corrupção continue grassando nas prisões de nosso estado. Quem vai querer combater a corrupção para valer e se transformar numa nova Sidneya?
Os assassinos impunes de Sidneya ajudam a compor a cifra vergonhosa dos homicídios não esclarecidos no estado do Rio de Janeiro. Pesquisa coordenada por Luiz Eduardo Soares, em 1996, indicou que apenas 8% dos homicídios aqui cometidos, são esclarecidos pela polícia. Hoje se diz que esse percentual aumentou e que estaria próximo dos 30%. Ninguém sabe ao certo e estamos buscando recursos para atualizar os dados. O que importa, no entanto, é ressaltar com toda ênfase e indignação que matar neste estado e neste país sai barato. Sai barato para os assassinos de uma diretora de penitenciária e sai de graça para os assassinos de gente comum.
A procura dos assassinos de Tim Lopes tem mobilizado toda a polícia do Rio de Janeiro. É justo? É justíssimo. As qualidades de Tim Lopes como ser humano e como profissional foram apontadas ao longo dos últimos dias e nem uma única palavra do que foi dito é exagerada ou falsa.
Conhecia o Tim desde os tempos em que dirigi o Sistema Penitenciário do Rio de Janeiro, entre 1991 e 1994, e um acompanhava o que o outro fazia. Os encontros, embora poucos ao longo dos anos, foram momentos em que eu ouvia atenta os relatos empolgados de Tim sobre as reportagens em que estava envolvido. Jornalista corajoso e criativo, ousou querer mostrar como as populações pobres em muitas áreas da cidade vivem aterrorizadas e impotentes diante das leis do tráfico.
Sidneya também ousou enfrentar o tráfico que, dentro das cadeias, corrompe agentes penitenciários e, fora dela, corrompe advogados e a polícia. Sidneya era, como Tim, determinada. Sidneya era, como Tim, corajosa. Não conseguiu, como Tim, finalizar o que havia iniciado. Como anda o inquérito sobre sua morte? Até onde a polícia se mobilizou para encontrar seus assassinos?
Como Sidneya, milhares de homens e mulheres são mortos a cada ano no Rio de Janeiro. Só nos últimos dez anos houve 67.700 assassinatos no estado. A quase totalidade desses homicídios permanece impune. A imensa maioria das vítimas é composta de jovens pobres, negros e favelados. E, para se ter uma idéia da magnitude do número de assassinatos em dez anos no Rio de Janeiro, é bom lembrar que em dez anos de guerra no Vietnam, morreram 58.152 americanos!
O Portal Viva Favela, do Viva Rio, tem registrado e-mails impressionantes, enviados por moradores de comunidades carentes do estado. Dizem eles: Nos sentimos fracos, quase sem voz. Os problemas têm que atingir alguém de fora da favela para perceberem o que é o nosso dia-a-dia; Fico abismado quando vejo bombeiros desenterrando vários esqueletos em busca de um, e tratar os outros com descaso.
Que a morte de Tim e a procura por seu corpo, que contribuiu para expor a realidade brutal dos cemitérios clandestinos existentes em algumas favelas do Rio, também sirvam para acordar a consciência cidadã dos fluminenses, de forma permanente. Que os assassinatos de todos, jovens e velhos, pobres e ricos, homens e mulheres, possam nos indignar, como a morte de Tim nos indignou.