Depois da festa das eleições, duros desafios esperam o governo. As prioridades dos governos se expressam, ainda que imperfeitamente, na fala presidencial. Há temas sobre os quais você insistiu durante a campanha e aos quais você continua dedicando grande parte de seus pronunciamentos, depois de eleito. Derrotar a fome e o desemprego são duas de suas obsessões, talvez as mais marcantes. Quem poderia discordar dessas prioridades? Sabemos, Lula, que há muitos de nossos irmãos passando fome, e não apenas desnutridos, como insistem alguns. Sem dúvida é vergonhoso que a 9ª economia do mundo conviva com tantos milhões de brasileiros passando fome. Trazer a fome para a agenda política e manter a urgência de sua derrota como prioridade absoluta é fundamental.
No entanto, meu caro Presidente Lula, há um outro tema, também importantíssimo, que vem sendo esquecido na pesada agenda pós-eleições. O candidato Lula insistiu que a segurança pública seria prioridade no seu governo e assegurou que a luta contra a corrupção policial mereceria providências imediatas. Você repetiu, inúmeras vezes, para audiências diversas e na televisão, que, como Presidente da República, seria o indutor das políticas de segurança, reunindo os governos federal, estaduais e municipais para discutir e implementar as propostas do PT para a segurança pública. Desculpe-me a cobrança, talvez um pouco fora de hora, um pouco adiantada, mas o silêncio sobre este tema me preocupa.
É evidente que, para reduzirmos de forma substantiva os níveis de criminalidade e violência neste país, precisamos investir recursos consideráveis na área da prevenção. Ao longo dos oito anos do Governo Fernando Henrique, houve melhoria de vários indicadores sociais, mas os níveis de desigualdade no Brasil permaneceram inalterados. Ricardo Henriques, do IPEA, demonstrou que as desigualdades econômicas e raciais neste país continuam rigorosamente as mesmas pelo menos nos últimos 30 anos, a despeito das inúmeras mudanças aqui ocorridas. Saímos da ditadura, passamos pela abertura, enfrentamos a crise do impeachment de um presidente, consolidamos nossa democracia em diversos campos, e, ainda assim, continuamos com uma distribuição de renda que nos coloca numa triste posição de liderança, entre os países mais desiguais do mundo. Ora, como acentuam os estudiosos da matéria (e como já apontaram estudos do Banco Mundial e do BID – entidades pouco suspeitas de qualquer radicalismo de esquerda), os países mais desiguais são os mais violentos. São as sociedades mais desiguais aquelas que mais sofrem com a criminalidade e a violência.
Para combater a desigualdade, o PT tem inúmeros programas na área social, que podem provocar mudanças efetivas em espaço de tempo reduzido, porque são políticas compensatórias. A médio ou longo prazo, esse conjunto de medidas terá um impacto decisivo, também, na prevenção da criminalidade. Entretanto, a situação de descalabro a que chegou a segurança pública em nosso país requer medidas emergenciais, de curto prazo, que estão detalhadas em seu programa. Aliás, Lula, você liderou todo o processo de elaboração do melhor e mais completo programa de segurança pública que este país já teve, e que se encontra disponível no site do PT. Como indica esse programa, as medidas devem ser implementadas pela Secretaria Nacional de Segurança Pública, vinculada diretamente à Presidência da República. O espaço institucional da Secretaria define a sua prioridade. Mantê-la junto ao Presidente é dizer à sociedade brasileira: a segurança pública é prioridade no meu governo. Estou trazendo para junto de mim essa preocupação e estarei voltado para esse tema, tanto quanto para a fome e o desemprego.
Meu Presidente, rompa o silêncio das últimas semanas no que se refere à questão da segurança. Volte a tratar do tema nos seus pronunciamentos mostrando que ele de fato será prioridade do seu governo. O povo quer ter a certeza de que a agenda do Presidente eleito é a mesma agenda do candidato. E de que estamos iniciando uma nova era, de seriedade no enfrentamento do crime e da violência. Pois, para não ter medo de ser feliz, é preciso não ter medo. Desejo-lhe boa sorte, caríssimo Presidente.