Punir o infrator, não o contribuinte

Como responsável pela coordenação técnica do último Censo Penitenciário do Ministério da Justiça, posso afirmar, sem risco de cometer equívocos, que pelo menos 30% dos presos neste país cometeram crimes sem gravidade ou violência.

O que significa isto? Isto quer dizer que os recursos advindos dos impostos do contribuinte brasileiro estão sendo muito mal gastos.

Utilizar a pena privativa de liberdade para indivíduos que não apresentam uma ameaça concreta à sociedade, além de ser, para o infrator, punição desproporcional ao delito cometido, é uma punição para o contribuinte.

Em primeiro lugar, porque se mantém na prisão um infrator que não é perigoso a um custo altíssimo: o custo médio mensal de um preso no pais é de R$ 364,71, mas no Distrito Federal, por exemplo, este valor chega a R$ 1.268,42.

E, o que é pior, além de pagar caro para manter alguém na cadeia, o contribuinte é penalizado porque esses homens e mulheres que cometem pequenos delitos estão-se transformando em pessoas muito piores ao longo de suas penas e, certamente, uma vez fora dos muros, cometerão crimes mais graves, como demonstram as pesquisas.

O contribuinte também é punido porque tais infratores poderiam estar prestando serviços à comunidade, proporcionando considerável economia de recursos em atividades diversas. Adequando as habilidades do infrator às necessidades da comunidade é possível obter-se os mais variados serviços a custo zero, tanto na área pública quanto naquela de entidades assistenciais. No Rio Grande do Sul, por exemplo, há uma instituição para cegos carentes que foi praticamente construída por infratores condenados à prestação de serviços à comunidade. Em Mato Grosso do Sul, inúmeras APAES (Associação dos Pais e Amigos dos Excepcionais) são auxiliadas com a ajuda financeira e com o trabalho dos prestadores de serviços.

As chamadas penas alternativas, aí incluídas multas, prestação de serviços à comunidade e outras tantas, são amplamente utilizadas nos mais diversos países. Nos Estados Unidos elas constituem 68% das condenações e, em alguns países europeus, tais percentuais são ainda mais altos.

No Brasil, o quadro é muito diferente: apenas 2% do total de condenações referem-se às penas restritivas de direitos, que incluem a prestação de serviços à comunidade.

Duas razões fundamentais explicam a pouca utilização de penas alternativas no Brasil . Em primeiro lugar, faz parte do imaginário popular vincular pena à prisão: alguém só é suficientemente castigado ao perder a liberdade. O povo pensa assim e o juiz também. Por outro lado, a legislação atual limita muito a possibilidade das penas alternativas.

A reversão deste quadro impõe-se como tarefa das mais urgentes e, com esta preocupação, o Conselho Nacional de Política Criminal e Penitenciária elaborou proposta de alteração legislativa aumentando a abrangência das alternativas à pena de prisão e oferecendo, igualmente, novas modalidades de punição.

No final de 1996, o ministro da Justiça, Nelson Jobim, apresentou o Projeto de Lei ao presidente Fernando Henrique Cardoso, que já o enviou ao Congresso Nacional.

Um país como o Brasil que, pelos últimos números do IPEA, ainda tem 16 milhões de miseráveis, não pode se dar ao luxo de manter na prisão infratores que não são violentos nem perigosos. Ouçamos os parlamentares.

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