Objetivo da lei era diminuir as prisões provisórias, mas número aumentou.
Para Defensoria, fianças ‘impagáveis’ mantêm mais pobres nas cadeias.
A Lei 12.403, que criou medidas cautelares com o objetivo de combater a banalização da prisão provisória no país, completa um ano nesta quarta-feira (4) sem cumprir sua principal missão. O número de presos sem julgamento continua aumentando e, segundo especialistas, uma aplicação falha da lei tem contribuído para que essa população carcerária seja composta cada dia mais por pessoas mais pobres.
Dados do Departamento Penitenciário Nacional (Depen) do Ministério da Justiça mostram que a lei ainda não resultou em uma diminuição na população carcerária brasileira (veja gráfico ao lado). Embora o o número de presos provisórios tenha crescido menos (o aumento em 2011 foi de 1%, contra 2,9% em 2010), o total de presos provisórios chegou a 217 mil no em dezembro de 2011, último número disponível.
Para defensores públicos, o motivo é uma falha na aplicação da lei. Eles afirmam que juízes têm privilegiado a fiança em detrimento de outras medidas. Na prática, o resultado é uma piora na situação prisional: quem não tem dinheiro fica preso, mesmo tendo direito à liberdade provisória.
O G1 listou casos de aplicação da nova lei no último ano. Entre eles, o de um juiz que aplicou medida de recolhimento noturno ao domicílio a um morador de rua preso em flagrante por furto (leia: “Sob nova lei, juiz mandou morador de rua ficar em casa à noite em SP”). O problema, para a Defensoria Pública, era óbvio: em que domicílio?
Além disso, especialistas afirmam que alguns juízes não têm especificado os motivos das preventivas em suas decisões e, em muitos casos, nem sequer têm usado as medidas, determinando a prisão quando caberia uma medida cautelar.
Quem fica preso?
Antes da nova lei, o próprio flagrante justificava a prisão. Agora, o juiz precisa fundamentar a decretação de uma prisão preventiva, que deve ser aplicada apenas como última saída.
A lei serve para quem não é reincidente e cometeu um crime com pena prevista de até 4 anos. São nove medidas restritivas de liberdade, entre elas estipular o pagamento de uma fiança e não permitir que a pessoa saia da cidade (veja lista abaixo).
A intenção da lei era não mandar para a prisão alguém que, mesmo condenado, não seria preso (uma pena de 2 anos, por exemplo, seria substituída por prestação de serviço à comunidade, mas em muitos casos, o réu ficava preso mais do que isso antes de ser julgado).
‘Jeitinho’
O primeiro solto pela nova lei, no dia 4 de julho do ano passado, foi proibido de frequentar uma casa de prostituição. Segundo defensores públicos e pesquisadores, no entanto, a tendência de juízes desde então foi a de privilegiar outra medida: a fiança.
“O problema disso é que se a pessoa furtou o desodorante, e o juiz fixou um salário mínimo para sair, ela não paga e fica presa”, afirma a defensora pública Virgínia Sanches Rodrigues Caldas Catelan, coordenadora no Dipo (Departamento de Inquéritos Policiais e Polícia Judiciária), que concentra as prisões em flagrante da capital paulista.
Segundo dados do Depen, São Paulo não apenas não conseguiu reduzir as prisões provisórias, como teve aumento de 3,6% em 2011, mais do que o triplo do percentual nacional.