RJ tem maior número de mortes por policiais em 22 anos; e o 2º menor índice de homicídios já registrado pelo ISP

Foram 741 mortes causadas por policiais nos 5 primeiros meses de 2020. São quase 5 pessoas mortas por dia pela polícia no RJ. Número de homicídios cai e bate recorde.

O Rio de Janeiro vive em um início de ano de recordes nos números da violência. Por um lado, nunca foram registradas tantas mortes por ação policial nos últimos 22 anos. De outro, houve o segundo menor registro de homicídios desde 1991 — quando os dados começaram a ser contabilizados.

A comparação é relativa aos cinco primeiros meses de cada ano. Os dados foram obtidos pelo G1 com exclusividade.

O estado registrou 741 vítimas nos cinco primeiros meses de 2020, o que equivale a quase cinco pessoas mortas diariamente no RJ por agentes do estado.

De toda a série histórica registrada pelo Instituto de Segurança Pública do Rio (ISP-RJ), esse foi o maior número de vítimas causadas por policiais no RJ nos cinco primeiros meses de um ano desde 1998.

O G1 analisou índices de mortes em ações policiais no RJ, que mostraram que 78% das vítimas são pretas ou pardas. (Veja no gráfico a seguir a evolução dos números ano a ano).

22/01/2020

Governo Witzel registra números mais altos

Os dois maiores índices da séria histórica foram registrados nos últimos dois anos, 2019 e 2020. A especialista em segurança pública e socióloga Sílvia Ramos afirmou ao G1 que os números se consolidam a partir de 2018, quando houve a intervenção militar na segurança do Rio de Janeiro.

 “O que nós verificamos é que, em 2018, o ano de intervenção militar, consolidou-se uma política de segurança baseada em operações de conflito. Quando chega a intervenção, chega uma ‘coisa militar’ declarada. Muito parecido com as operações de guerra e deixa de lado a inteligência”, afirmou.

“Em 2019, com a chegada do Witzel, temos a combinação do governo com um discurso agressivo e ofensivo com as favelas. Isso culminou com uma polícia que perdeu o rumo com as operações de inteligência. São resultados muitos dramáticos. É um discurso de ‘liberalização’ da execução”, completou Silvia Ramos.

Polícia enfrenta ‘armas de terroristas’, diz delegado

O diretor do Departamento Geral de Homicídios e Proteção à Pessoa (DGHPP), delegado Antônio Ricardo Nunes, afirmou que a polícia enfrenta “armas de terroristas” durante operações no Rio de Janeiro. Ele afirmou que o confronto entre criminosos e policiais não é bom para moradores de “áreas conflagradas”, mas ressaltou a importância da presença do estado nesses locais.

“Essas pessoas que acabam morrendo em confronto com as policias são pessoas que se escondem em guetos dominados por organizações criminosas, que utilizam armamento de guerra para manter os seus territórios. Quando há incursão das polícias, eles usam esse armamento que são consideradas armas de terroristas. Esse enfrentamento é ruim para o morador, mas a necessidade do estado se fazer presente é importantíssima”, disse Nunes.

Dentro dessa estatística estão casos de vítimas inocentes que perdem a vida nestes confrontos. Em maio, o menino João Pedro Mattos, de 14 anos, foi morto no Complexo do Salgueiro, em São Gonçalo, na Região Metropolitana do Rio. Ele estava brincando com os amigos quando foi baleado durante uma ação das polícias Civil e Federal.

A mãe de João Pedro, Rafaela Coutinho Mattos, conversou com o G1 e disse que não se sente segura quando está perto da polícia. Ao ficar sabendo dos dados registrados pelo ISP, ela afirmou que a política de segurança pública do estado precisa ser revista.

“Eu não sei o que eu vou sentir quando tiver uma operação dessa novamente. É complicado ver pessoas que deveriam nos proteger, matando tanto. Você não sabe se está segura ou não quando a polícia está presente”, disse Rafael Mattos.

“Eu acho essa política de segurança precisa ser revista. É complicado você entrar num lugar e atirar sem saber quem está presente. Essa política de “é para atirar” não pode acontecer. Essa política precisa ser refeita. Não consigo entender essa inteligência da polícia que já chega atirando em quer que seja e mata tanto”, completou a mãe do menino João Pedro.

Segundo a especialista Silvia Ramos, a falta de credibilidade de moradores de comunidades com agentes do estado ocorre porque, para eles, não há resultado efetivo nas operações realizadas no Rio.

“O que nós temos é uma política que produz imensa desconfiança e medo nos moradores e nenhuma efetividade na desarticulação dos grupos criminosos. A longo prazo, essas operações aquecem o mercado de armas. As operações apreendem dois fuzis e não desarticulam essas organizações criminosas. Eles [criminosos] só se fortalecem com essa política”, disse.

Homicídios caem e batem recorde no RJ

Apesar de haver números altos nas mortes por intervenção policial, o índice de homicídios caiu no estado do Rio em maio: foram 273. Este é o segundo menor número registrado na série histórica desde 1991.

O número de assassinatos neste mês só não foi menor do que em junho de 2015, que registrou 272 homicídios no RJ.

22/06/2020

O delegado Antônio Ricardo Nunes, responsável pelo departamento que investiga esses crimes, afirmou que um dos fatores que causaram essa queda foi o número de prisões realizados no início de 2020. Foram 225 criminosos capturados, sendo 106 traficantes ou milicianos deste total.

“As ações de combate ao crime organizado frequente, especialmente a prisão de matadores contumazes como milicianos e traficantes, é um fator preponderante para redução do homicídio no estado do Rio de Janeiro. Somente esse ano, até o momento, nós já prendemos 64 milicianos e 42 traficantes envolvidos em homicídios”, disse o delegado.

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