O melhor seria cada prefeitura reconhecer nesses grupos um espaço de diálogo
Você pode até não saber, mas seu bairro já deve estar na internet. Em um país com mais de 120 milhões de conectados, no qual 85% vivem em cidades, sobram moradores para participarem desses territórios online. No Rio de Janeiro, por exemplo, uma pesquisa conduzida por Pablo Nunes revelou a existência de 154 páginas e grupos no Facebook para cobrir os 160 bairros do município. Mesmo em um lugar com tanta desigualdade social, com lagoas e florestas no meio, os territórios físicos e os virtuais se sobrepõem.
O fenômeno é antigo. Comunidades de territórios existem pelo menos desde o extinto Orkut. Mas é urgente discutirmos o papel desses grupos para suprir carências da cidade que não encontramos em outro lugar.
O Brasil, como outros países, enfrenta uma grave crise do jornalismo local. Emissoras e jornais regionais nunca demitiram tanto. E os que sobrevivem tendem a criar materiais com apelo nacional. Falta, com isso, conteúdo produzido para falar da vida dos bairros. Nesse cenário, as comunidades online de bairros brilham. Inclusive, a pesquisa mostra que a comunidade online no Rio com mais seguidores está atrás apenas da página de Facebook do maior grupo de notícias da cidade.
Violência: eis um tema que assola o imaginário do brasileiro. Estudos mostram que a cobertura de crimes nos jornais cresceu muito mais do que as taxas de criminalidade em si. A pesquisa feita no Rio de Janeiro dedicou-se justamente a esse tema. No cenário mapeado, 44% do conteúdo produzido sobre os bairros trata justamente de crime, cotidiano e política. Será que há tanto crime assim nos bairros? Ou estamos recriando o exagero na cobertura criminalística que o jornalismo tradicional sem querer retratou?
Por um lado, é ótimo saber que há redes de voluntários dedicados a encontrar soluções para problemas da cidade. Tráfico de drogas, operações policiais e identificação de locais inseguros são problemas sérios. Por outro lado, existe espaço nessas comunidades para o fomento da justiça pelas próprias mãos, como no caso da publicação de fotos de “suspeitos”.
Mas há motivos para celebrar. Essas comunidades são locais únicos para compartilhar a memória dos bairros, com fotos antigas e histórias da região, ou ainda para espalhar mensagens de paz, como pessoas que plantam girassóis na calada da noite, para criar uma agenda positiva na mente de todos.
O melhor dos mundos seria cada prefeitura reconhecer nesses grupos um espaço de diálogo. Levar o poder público até lá. A prefeitura de Buenos Aires mapeou todas as comunidades online que falavam sobre espaços públicos. Com base nisso, interagiu com os grupos e de quebra ganhou de voluntários para ajudar na conservação. Se, no Brasil, cada bairro tem uma página, e toda prefeitura é feita de bairros, vale a tentativa de ocupar esses espaços para promover um governo mais aberto.